02.10.08
Ironia tomando a vida a sério
»Até hoje o segredo está bem guardado. Quase ninguém sabe o verdadeiro nome do homem. O certo é que Admirável Diamante Bruto não é o seu nome de registo. Mas então como é que os documentos que hoje ostenta têm todos no lugar da identificação a frase feita nome próprio: Admirável Diamante Bruto?!«
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Waldir Araújo
Admirável diamante bruto e outros contos.
144 páginas,
Livro do Dia 2008
Waldir Araújo nasceu em 1971 em Guiné-Bissau. Foi a Portugal em 1985 para completar os estudos secundários e académicos, e exerce a profissao de jornalista desde 1996. Desde 2001 trabalha para RDP África. Admirável diamante bruto e outros contos é seu primeiro livro.
http://riogeba.blogspot.com
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Os contos, que Waldir Araújo, jornalista Guineense radicado em Portugal, finalmente reúne neste seu primeiro livro, são, sem dúvida, mais do que diamantes brutos. São palavras bem lapidadas, estórias bem contadas, de vidas pequenas e grandes aspirações, vidas e mortes, sempre traçadas com um «fino fio de humor e séria ironia» como diz o outro especialista do gênero, Ondjaki, em seu prefácio.
Já há alguns anos Waldir Araújo vinha juntando contos e poesias em seu blog intitulado »Rio Geba«, e na medida que este blog foi crescendo, percebia-se que havia aí um contista de qualidades extraordinárias. Agora, finalmente, estes contos (e outros inéditos) encontraram a sua forma adequada de livro, carinhosamente editado pela Editora Livro do Dia.
Quem acompanhava o blog (infelizmente parado desde 2007) já sabia das andanças de Carlos Nhambréne por exemplo, que foi salvo pela própria morte (conto também publicado na novacultura), mas mesmo assim terá todo prazer em reler este texto mais vezes, ou de, em seguida, descobrir os segredos de Mina (que acaba se apaixonando pelo escritor ambulante a quem encomenda cartas a um amante ausente) ou outro amor evaporado sob o título «A herança», e mais casos do gênero.
O fino humor de Waldir Araújo se junta a um sincero carinho com que a sua escrita toma os seus protagonistas realmente a sério, traçando finas estórias de pequenas felicidades e desesperos profundos, nunca desimportantes – estórias preciosas enfim, como o título bem escolhido sugere. Mencionamos ainda «O último salto» sobre um leitor perseguido por uma frase preocupante – um motivo aliás recorrente em outros contos –, a comovente estória do Senhor Rachid, vendedor de flores paquistanês, ou do «Escritor do Solitário» afinal inventado pelo próprio protagonista.
Cada um dos 13 (!) contos reunidos neste volume é – repito-me – uma jóia, pequenas peças de grande literatura. Uma revelação, certamente, de uma voz rara, expressão de um excelente observador do quotidiano, da vida em seus pormenores, do ser humano em suas tragédias e comédias.
Grande literatura em pequenos fragmentos, admiráveis, raros e muitíssimo bem contados.
Michael Kegler
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